Um dos tópicos mais conhecidos, e ao mesmo tempo um dos menos entendidos, do mundo industrial é o lean manufacturing, ou manufatura enxuta. Desde que a Toyota popularizou o conceito, há um crescente interesse pelo tema, o que coincide com a globalização da indústria e consequente aumento da concorrência.

Qual gestor de uma fábrica não gostaria de aumentar a produtividade e reduzir o desperdício? É comum que quando o setor de produção está passando por um momento complicado, como atrasos e defeitos excessivos, os responsáveis busquem ideias como a manufatura enxuta para implementar.

Entretanto, como vamos ver, a principal causa de insucesso de uma abordagem lean é a falta de comprometimento com a melhoria contínua. A manufatura enxuta não pode ser utilizada apenas como um instrumento para apagar incêndios.

Além disso, os maiores exemplos que temos de lean manufacturing funcionando com sucesso são de grandes empresas, como as montadoras japonesas. Isso pode causar certo receio e descrença nos gestores de pequenas fábricas.

A verdade é que as ideias enxutas podem ser aplicadas em praticamente qualquer contexto, seja uma pequena empresa, uma grande corporação, ou até mesmo em áreas da sua vida pessoal.

Uma grande vantagem dessas ideias é que elas requerem poucos recursos para serem implementadas. Não é preciso um investimento em mais equipamentos nem a contratação de um especialista. Tudo o que você precisa para implantar a lean manufacturing em pequenas empresas é de um pouco de conhecimento e boa vontade.

Vamos então conhecer mais sobre essa abordagem e aprender algumas dicas sobre como aplicar os conceitos de maneira prática para uma pequena fábrica, alcançando resultados consistentes e melhorando a produtividade e qualidade da empresa.

 

O que é Lean Manufacturing?

 

Antes de tudo, a manufatura enxuta é uma filosofia de gestão. É oriunda e inspirada no Sistema Toyota de Produção (STP), desenvolvido por Taiichi Ohno, no Japão pós Segunda Guerra Mundial.

A lean manufacturing passou a ser conhecida por esse termo no final da década de 80, quando John Krafcik o cunhou. Se popularizou por entregar excelentes resultados para indústrias, com a Toyota servindo de modelo.

A premissa principal da manufatura enxuta é a redução do desperdício. Segundo a filosofia, toda atividade que não gera valor deve ser eliminada.

É algo simples de expressar, porém, não tão fácil de implementar. Para começar, o desperdício nem sempre é algo visível. Taiichi Ohno definiu sete tipos deles, conhecidos também como muda, sendo eles:

  • Desperdício de transporte/movimento de materiais;
  • Desperdício de estoques;
  • Desperdício de movimentos excessivos;
  • Desperdício de tempos de espera;
  • Desperdícios de superprocessamento;
  • Desperdícios de superprodução;
  • Desperdícios de defeitos.

A filosofia de manufatura enxuta defende uma análise completa da cadeia de produção de uma empresa, com a identificação dos desperdícios e consequente remoção, deixando apenas atividades que agreguem valor.

Outro ponto chave da lean manufacturing é uma abordagem de melhoria contínua, um ciclo chamado de kaizen. Segundo a filosofia, a empresa deve estar engajada em uma busca constante e diária pela melhoria, e não abordá-la como um projeto que possui fim.

 

Características do lean manufacturing

 

Para se tornar um sistema de produção prático, a manufatura enxuta se apoia em algumas características fundamentais em sua operação. Essas características são orientadas à eficiência e buscam como objetivo principal a redução de custos.

Segundo o próprio Taiichi Ohno em seu livro O Sistema Toyota de Produção, “A redução de custos deve ser o objetivo dos fabricantes de bens de consumo que busquem sobreviver no mercado atual".

Vamos falar um pouco então de quais são as ferramentas do lean manufacturing.

Produção puxada

A primeira característica é a produção puxada. Isso quer dizer que o fluxo de produção é invertido.

Em um sistema comum, na produção empurrada, o fluxo é orientado do começo ao fim, ou seja, desde o estoque de matéria-prima até o produto acabado e embalado. A oferta de peças no estágio anterior orienta a produção do próximo estágio.

Já na produção puxada, é a demanda do próximo estágio quem orienta a produção do estágio anterior. A demanda vem antes da oferta. Nada é produzido em qualquer estágio sem que o próximo estágio ordene. Começando pela venda ao cliente, até chegar ao estoque de matéria-prima.

Um mecanismo muito comum utilizado nesse sistema é o kanban. Esse é basicamente um instrumento de comunicação, localizado onde a produção se faz necessária. Geralmente é um papel com as instruções e as quantidades de peças necessárias, que vai sendo transferido de estágio em estágio.

Rigorosamente, um estágio só pode produzir se estiver com um kanban, e apenas a quantidade especificada por ele. O movimento das peças entre os estágios consequentemente também é acompanhado por este.

Just-in-time

O just-in-time é na verdade o pilar que governa a lean manufacturing. As outras características são basicamente derivadas do fato de se buscar o just-in-time.

Ele significa que em um sistema de produção em fluxo, as peças necessárias a um estágio o alcançam no momento em que são necessárias e exatamente nas quantidades em que são necessárias.

É fácil pensar em não atrasar as peças, mas o just-in-time também prega que não haja adiantamentos. Isto é, o fluxo deve ser tal que as peças sempre cheguem ao próximo estágio no momento exato necessário.

Uma empresa que consegue implementar esse sistema com maestria consegue virtualmente zero estoque. O objetivo é sempre buscar uma produção fluida, sincronizando toda a cadeia.

E a Toyota não se limitou à linha de produção para a implantação dessa ideia. Os fornecedores também são selecionados e orientados de maneira que entreguem as partes necessárias no exato momento da demanda.

Pequenos lotes

A lógica mais aceita e que perdura no senso comum das pessoas é que grandes lotes é sinônimo de eficiência. Em uma fábrica, sabemos que se tem um custo de setup e que esse custo pode ser amortizado ao se aumentar o tamanho do lote.

Entretanto, a lean manufacturing, filosofia de gestão de produção hoje considerada uma das mais eficientes, prega exatamente o contrário. Por quê?

Seguindo a abordagem de eliminação total de desperdícios, nunca devemos desperdiçar recursos (tempo, máquinas, mão-de-obra e matéria-prima) em itens que não possuem demanda imediata.

Grandes lotes nos obrigam a fazer peças e produtos que não são necessários no momento, indo contra o just-in-time e ocasionando o aumento do estoque.

Controle visual

Na lean manufacturing, o controle visual da produção é muito importante. Os planos de produção devem ser comparados visualmente com o resultado real da manufatura. Isso ajuda a identificar os problemas de maneira mais fácil.

Implementar um sistema de gerenciamento visual ajuda a melhorar a comunicação dentro da empresa. Cria não só transparência como também uniformidade.

Mas o principal objetivo do controle visual é o de melhorar o sistema como um todo por meio da identificação e prevenção de erros e defeitos. Por exemplo, peças que necessitam retrabalho podem ser facilmente identificadas visualmente dentro de uma linha de produção.

Por isso a manufatura enxuta defende não só ferramentas de controle visual, mas também um contato direto dos gestores com a linha de montagem, chamado de gemba. É no gemba que os problemas acontecem e podem ser identificados antes de causarem mais danos.

 

Como implantar o lean manufacturing em pequenas empresas

Ao se analisar todos os aspectos da manufatura enxuta, pode parecer assustador para o gestor de uma pequena fábrica pensar em colocar em prática todas as diretrizes.

Muitas das premissas da lean manufacturing podem significar um rompimento grande com a maneira como a empresa sempre trabalhou. É, sobretudo, uma mudança de mentalidade enorme, e é fato que irá encontrar certa resistência entre os trabalhadores da fábrica.

Entretanto, como a própria abordagem de melhoria contínua sugere, é possível implementar um processo cíclico onde a empresa vai se adaptando aos poucos.

Levantar hipóteses, implementá-las, observar os resultados e corrigir a rota faz parte desse ciclo fundamental e pode ser o grande guia na implementação do lean manufacturing para pequenas empresas.

As práticas não requerem altos investimentos, basta comprometimento e dedicação dos envolvidos com o projeto lean manufacturing. Confira algumas delas e como implementá-las:

Comece entendendo sua cadeia de valor

Desenhe uma linha do tempo. Na extremidade esquerda, está o momento em que o cliente entrega um pedido. Na extremidade direita, o ponto em que a empresa recebe o dinheiro.

Agora, trace todos os passos que são necessários para ir de um ponto ao outro. Você irá perceber que existem etapas que não agregam valor ao sistema. Seu objetivo é encurtar a linha do tempo removendo todas essas etapas onde há desperdícios.

Lembre-se que os desperdícios muitas vezes não são tão óbvios. Por isso a gestão visual é tão importante.

Consiga que as pessoas envolvidas estejam de acordo

Mesmo uma pequena fábrica geralmente depende de várias pessoas para produzir um bem. Se essas pessoas se relutarem a cooperar para que a manufatura enxuta tenha sucesso, então a implementação falhou antes mesmo de começar.

Pode ser que muitas pessoas sejam céticas a princípio, ser resistente à mudanças é natural do ser humano. Por isso, é importante mostrar os benefícios que podem ser colhidos com o lean manufacturing para pequenas empresas.

Talvez você possa focar em apenas uma pequena área, e quando os resultados começarem a surgir, fica muito fácil de conseguir a aceitação de todos.

Foque em reduzir o desperdício

Ao buscar uma redução dos desperdícios dentro de uma fábrica, principalmente os relacionados à superprodução e defeitos, você pode experimentar os maiores ganhos com os menores esforços.

Geralmente o principal alvo é o desperdício de tempo. Nenhum gestor suporta ver um trabalhador de linha de produção parado e logo corre para consertar, muitas vezes o colocando para produzir peças que não são necessárias no momento, o que incorre em outro desperdício.

Porém, focar primeiro em reduzir o estoque pode ser muito mais significativo. E não é apenas do estoque final ou do estoque de matéria-prima que estamos falando. O estoque em trânsito, ou seja, aquele que se acumula ao lado das máquinas, é um grande vilão da produtividade e a principal causa de atrasados na entrega de pedidos.

Outra grande fonte de problemas são os defeitos. Se você produz peças com defeitos, você não trabalhou. Geralmente essas peças vão ser retrabalhadas sem uma identificação e solução das causas daqueles erros.

É fundamental identificar e solucionar esses defeitos para que não aconteçam mais. O tempo “perdido” nesse processo é compensado por evitar retrabalhos futuros.

Colete e analise dados

Esse geralmente é um passo totalmente ignorado em pequenas empresas. Porém, a coleta e posterior análise de dados da produção pode trazer muitos benefícios.

Desde revelar problemas ocultos até mostrar se os esforços estão indo na direção certa, analisar dados é um processo em que os benefícios são muito maiores do que os esforços e custos para implementá-lo, não importa o tamanho da empresa.

Os dados são gerados o tempo todo dentro de uma fábrica em operação, cabe apenas aos gestores instituir uma maneira de coletá-los e analisá-los. Não é necessário contratar um mestre em estatística, basta um processo simples para entender esses eventos e transformá-los em informações valiosas para as tomadas de decisão dentro da empresa.

Desenvolva uma cultura de melhoria contínua

Lean manufacturing para pequenas empresas não se trata de implantar algumas ferramentas, obter ganhos e pronto.

É preciso realmente embarcar em uma jornada de sempre buscar melhorias, em um ciclo que nunca acaba.

As grandes empresas podem designar times específicos para essa área, não deixando a inércia tomar conta da corporação. Já as pequenas indústrias não podem se dar esse luxo. E é por isso que criar uma cultura de melhoria contínua é fundamental dentro da empresa.

Todos devem ser responsáveis pelo processo e criar a mentalidade necessária. Uma maneira é começar designando espaços de tempo específicos para trabalhar nesses projetos. Após um tempo, o sistema começa a gerar momento, até que todos se acostumem com a nova maneira de trabalhar e passem a buscar a melhoria contínua naturalmente.

A cultura lean manufacturing deve ser entendida como uma verdadeira filosofia de gestão, e não apenas um conjunto isolado de técnicas.

 

Conclusão

Procuramos nesse artigo trazer uma introdução ao lean manufacturing, sob a ótica das pequenas empresas, pensando nos desafios específicos de uma implementação desse ambiente.

Implantar o lean manufacturing em pequenas empresas não é tão diferente do processo em grandes corporações. Não há uma exigência de grandes quantidades de recursos nem de uma linha nova de equipamentos.

Porém, é fundamental o empenho e comprometimento de todos os envolvidos, buscando sempre melhorar a produtividade e reduzir o custo da fábrica. Se há um conceito em que você deve focar é o de melhoria contínua.

No começo os resultados podem não ser animadores, mas se o ciclo de melhoria for implantando, uma hora você irá colher os frutos. Sempre procurar analisar a situação e propor e implementar maneiras de melhorar é o segredo do lean manufacturing para pequenas empresas.

O progresso não pode se fazer quando estamos satisfeitos com a situação existente. Por isso, não se preocupe se você não tem o conhecimento necessário ainda ou se sua equipe é pequena e seu maquinário antigo, a filosofia de gestão enxuta pode levar sua empresa a um nível mais elevado.

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